sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Domingo à Tarde, p.9-10

«Por esse tempo, ou já muito antes, comecei a ser considerado um tipo insociável. Fumava desalmadamente, macerando o cigarros de um canto para o outro da boca, num jeito nervoso nada fácil de imitar, roendo a todo o momento qualquer danação íntima que se traduzia nos modos como fazia crer à pessoas que a presença delas me era insuportável. Tudo me servia para exagerar a brusquidão, talvez porque toda a gente reparasse nela e a censurasse, e a minha rebeldia agreste contra fosse lá o que fosse manifestava-se, provocante, tanto mais quanto os outros a receavam. Era eu a açulá-los ao espectáculo, a colocar-me no centro desta arena improvisada que é a vida. Mas o gozo era meu. Nos outros não admitia, pois é o riso o que particularmente me ofende nos medíocres.»



Fernando Namora, in Domingo à Tarde (Lisboa, 1961)

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