sexta-feira, 7 de outubro de 2011

O Trigo e o Joio, p.19

«– Pois não é, Barbaças... – prosseguia o Loas, indulgente. – Daqui a três anos é quinta feira, lua nova e, se calhar, como tu dizes, também é Outono... Gaitas, Barbaças, vem daí até à minha courela! – Ena, tão longe! O Loas poisou definitivamente o saco e sentou-se, como se se preparasse para uma longa exortação. Ti Joana, a mulher, percebeu imediatamente que o marido não arrancaria dali sem o Barbaças à ilharga e, resignada, prendeu a cabra a uma pedra e sentou-se também. A menina foi acarinhar os lombos da cadela e olhou à volta, procurando um divertimento para as horas que se seguiriam, enquanto o animal, aos pulos, a lambia do nariz às mãos. Alice, a menina, estava feliz. – Ora dizes tu que é longe! Um rapaz novo a negar-se a dois quilómetros de caminho! – Upa!... – Três quilómetros, no máximo, um raio me parta! Ceavas com a gente. – E o Loas passou as costas da mão pelos beiços, num gesto que evocava boas refeições.»



Fernando Namora, in O Trigo e o Joio (Lisboa, 1954)

1 comentário:

  1. Se um dia me perguntarem qual é o livro da minha vida, não hesito em afirmar que é o Trigo e o Joio... já o li duas vezes e a profundidade do absurdo da vida continuou

    ResponderEliminar